2011-10-31

A nação que eliminou a corrupção

Diz a lenda que havia no mundo uma nação muito exaltada por sua musicalidade, sua criatividade, suas belezas naturais e pela hospitalidade de seu povo. Essa mesma nação era também conhecida por sua intensa violência crônica e, sobretudo, pela corrupção de sua classe política.

Curiosamente, a lenda também conta que foi a violência que acabou com a corrupção. Certo dia, um dos cidadãos violentos dessa nação, profissional do ramo da execução por encomenda, descobriu uma nova forma de erradicar a corrupção: eliminando os políticos corruptos e seus respectivos corruptores. Contudo, havia dois entraves no caminho: o serviço desse profissional era caro, pois tratava-se de um dos melhores do ramo, e o número de corruptos e corruptores era assombroso.

Felizmente para o povo, o mesmo cidadão tão violento era igualmente inteligente. Maquinou um plano chamado por muitos de "surpreendentemente simples, economicamente viável e psicologicamente adequado" para eliminar os maiores inimigos do progresso de sua nação: criou um "Fundo de Erradicação da Corrupção". Nesse fundo, cidadãos de todo o território nacional podiam depositar a quantia que desejassem a fim de alcançar os altos valores cobrados pelo profissional violento e inteligente para executar seu serviço correcional.

Como a corrupção era um fenômeno absolutamente descarado e nada se fazia para escondê-la, foi bastante fácil compilar a lista dos principais corruptos e corruptores.

O sistema de doações voluntárias também resolvia o problema psicológico da execução de seres humanos: os doadores do FEC, como foi abreviado o fundo, evitavam sujar as mãos e também a consciência, pois eram agentes apenas indiretos das execuções.

O primeiro saque do fundo deu cabo do personagem ativo há mais tempo na cena da política corrupta. Belo cartão de visita do atirador-empreendedor. Aprovada e aplaudida pela população, a execução rendeu tantas doações ao FEC que em pouco tempo havia recursos suficientes para finalizar outros dois líderes da lista CC (corruptos & corruptores). Com a ausência dessas três figuras tão importantes no cenário político nacional, os três poderes decretaram recesso e paralisaram suas ações. Porém, o novo quarto poder ("executor", como ficou conhecido) logo indicou que não era isso que a população esperava de seus supostos representantes: o próximo da lista sofreu um estranho acidente de avião.

Ninguém sabia ainda quem era o cidadão-atirador-empreendedor, mas já se falava em elegê-lo ao cargo máximo. Ainda anônimo, ele respondeu que não tinha aspirações políticas: "Quero apenas fazer meu trabalho e ganhar um dinheiro honesto. Talvez abrir um restaurante ou uma fundação com a renda desses serviços.". Grande profissional.

Quanto à política e os políticos, o poder executor conseguiu levar a nação para o caminho da democracia. Movidos pelo medo, integrantes dos três poderes tradicionais passaram a trabalhar em prol da nação. Com a redução que "benevolentemente" fizeram em seus próprios gastos, conseguiram melhorar rapidamente a qualidade da saúde e da educação, dos transportes e da previdência, do planejamento e até do turismo.

O cidadão-atirador-empreendedor permanece incógnito; dizem que se aposentou e abriu um restaurante ou criou uma fundação. O fato é que, vez por outra, quando os políticos ameaçam fazer corpo mole, ele -- ou um de seus inúmeros admiradores -- faz questão de cravar seus cartões de visita em portas de carro, paredes e travesseiros bem próximos às cabeças certas, como que dando a elas uma chance.

Atualmente, essa nação praticamente erradicou a corrupção. É próspera e oferece alta qualidade de vida a seus cidadãos, que, mesmo sem as desgraças que os assolavam, permanecem extremamente musicais, criativos e hospitaleiros, além de continuarem em um território, dizem seus criativos músicos, bonito por natureza.